O movimento era o de sempre: mais nuvem, menos nuvem, alguma gente, mais gente, tanto barulho, pouco barulho, bastantes carros, não muitos carros... a mesma merda de sempre! Pensava ela, lá dentro, ao tempo que atirava pela janela a beata de cigarro mirrada. Foi até à cozinha onde as panelas já fervilhavam e espalhavam o cheiro a comida por toda a casa. O aspecto da divisão assemelhava-se ao da passagem de um pequeno Katrina, embora limpo, estava tudo desorganizadoramente desarrumado. Contudo, como qualquer mulher com a sua mala, ela encontrava qualquer coisa em três tempos, e rapidamente pegou numa grande colher de pau, duma madeira amarelada e gasta, mais pelo tempo do que pelo uso, levantou o testo de uma panela, afundou-a e emergiu-a, levando-a à boca.
Provou e fez uma expressão de nojo: raios de homem que tanto gosta de bacalhau, pensou ela. Bacalhau assado, bacalhau frito, bacalhau com natas, bacalhau desfiado, bacalhau gratinado, bacalhau à braz, bacalhau com cebolada, bacalhau com puré, pastéis de bacalhau, pataniscas de bacalhau, uma infinidade de maneiras de o cozinhar, mas sempre bacalhau, e hoje, era cozido. Fosse ele pesca-lo e por lá ficasse... malvado!, cismava ela, enquanto punha outro cigarro entre os lábios. Puxou fortemente o fumo do cigarro, inspirando, e, encostando-se à bancada, ficou alheada a olha-lo. Preciso de deixar este vício, e franzia o sobrolho, pois das duas, uma, é ele que me mata, e erguia uma sobrancelha, ou é aquela besta, que daqui a nada terei sentado à mesa, com os cantos da boca besuntados de azeite, e um hálito medonho a alho, e piscava um olho. Um dia... um dia, deixo... e, levou a mão ao canto da boca, nela aninhando o cigarro, enquanto, com destreza e um ar algo concentrado, espetava o garfo numa batata, verificando a cozedura.
Por essa altura soou a campainha. Raios, que o homem hoje chegou mais cedo, e já me vai moer o juízo, bateu a língua contra o céu da boca emitindo o som dum estalo, mas ainda não está na hora!, pensou, espantada. Com o passo acelerado, e limpando as mãos ao avental cintado ao corpo, foi até à porta e abriu-a. Bom dia, sou o Quim, o seu marido mandou-me cá para lhe arranjar a máquina de lavar roupa, diz que faz muito barulho ao torcer. Posso entrar? é que tenho ainda outro serviço antes das duas, vá lá Dona, tenho que me despachar. De volta à entrada da porta, de onde, por segundos, se tinha ausentado no seu imaginário, concordou, acenando a cabeça e encaminhou o homem até à cozinha.
O rapaz, jovem, por sinal, bem parecido e fisicamente bem constituído, sabia lá ela porquê, rapidamente mexeu nos botões da máquina, puxou-a e examinou-lhe a parte de trás. Enquanto isso, ela, encostada à mesa, mordiscando o polegar, procedia à análise atenta e detalhada do corpo do rapaz. Será que ele gosta de bacalhau? Será que lhe incomoda, como a mim, este cheiro? Deve ser vigoroso. Tem umas mãos bonitas, imagino o que não fará com elas. A roupa é assim a fugir para o azeiteiro, mas para o que seria, nem faz mal. Podia agarrar-me já aqui em cima da mesa e foder-me. Metia-me os dedos, daquelas lindas mãos, e só assim, eu vinha-me logo... És tão parva, mulher! Olha mas é a hora. Ainda por cima é um moço, repara lá em ti! Dona! Está a ouvir, Dona?! Perguntava o rapaz, que entretanto já se tinha levantado e, em frente a ela, fazia o relatório da avaria. Sim, sim. Estou a ouvir. Continue. Portanto, é isso, depende se tiver as peças, e se não, depende do tempo que a casa demora a arranja-las. Ainda por cima estou cheio de trabalho. entende Dona? O mais certo é ficar pronta apenas no fim da próxima semana. Credo! Nem por sonhos, não posso ficar tantos dias sem a máquina e a lavar roupa à mão! Leva-a hoje e entrega-ma amanhã. Disse-lhe sorrindo com um ar matreiro e piscando-lhe o olho. Ó Dona, nem pense nisso! Tenho outros serviços à frente, só cá vim porque o seu homem me chateou. Retorquiu-lhe ele, arqueando as sobrancelhas, apoiando as mãos por detrás das costas, sobre a bancada, e observando-a de cima a baixo. Sentindo o olhar atento e interessado do rapaz, ela rodou sobre a mesa, a fim de alcançar o telemóvel que estava na outra ponta, empinando o rabo. Ele, inspirou fundo, passou a palma da mão aberta pela cara, esfregando-a e quando a mirou de novo, ele empunhava o telemóvel, e com uma mão sobre a anca, argumentava, tentando convencê-lo a executar o serviço.
Ao que parecia, as divagações acerca do rapaz não teriam sido assim tão imbecis, cada vez mais levava a crer que o tesão era recíproco, e agora, os olhares trocados confirmavam o esconso desejo que lhes assoberbava os corpos. Plantada junto à mesa, sentia os mamilos endurecem, sentia o olhar dele a vê-los enrijecerem por debaixo da camisa, sentia uma torrente de calor por entre as pernas num ritmo descompassado de curtas e doridas palpitações, e numa derradeira tentativa para o convencer ao conserto da máquina, e encerrando o assunto por forma a que passassem de imediato à consumação da atracção, sentando-se, com a ajuda das mãos, sobre a mesa, disse-lhe desafiadoramente: tem a certeza de que não há forma de contornamos isso? Dona, bafejou ele em rouquidão, tenho a certeza de que podemos resolver isto da melhor maneira para ambos, e passou a mão sobre o membro grosso e proeminente sob a ganga gasta das calças, e que dando um jeitinho, e fazendo um esforço, até posso entregar-lhe a máquina hoje, ao fim do dia. Ela sorriu de orelha a orelha, ergueu a cabeça para trás, levou as mãos à cintura desapertando o avental, e deixou cair o corpo sobre os cotovelos, abrindo-lhe as pernas. Então faça lá o que tem a fazer, comandou-lhe ela, gargalhando.
Como um animal sedento, ele atirou-se sobre o seu peito, puxou-lhe a camisa para cima e encheu a boca com um dos seios, enquanto, com a mão, lhe molestava o outro. Trocou, e mais avidamente beijou-os. Sentiu-lhes o toque, o tamanho e a forma. Cheirou-os e com a boca, língua e dentes neles chafurdou. Ela gemia e contorcia-se sobre a mesa. Molhou-lhe os lábios nos seus, e afundou-lhe a língua na boca, e como uma serpente na água, ziguezagueou-a enquanto roçava o pénis duro contra ela. À medida que a afagava, despia-a, desajeitadamente. Ela levantou a cabeça, querendo ver-lhe as mãos... a água vertia pelas panelas e incendiava a chama do fogão. O exaustor ruía e o fumo intenso escapava ao aspirar do aparelho. Não era muito hábil, os tremores eram notórios, mas ainda assim, o toque, esse era majestoso, tal como ela pensara assim que as vira... aquelas lindas mãos. E com elas penetrou-lhe as coxas, ajustando-as ao seu corpo, levou dois dedos à boca dela e enterrou-os, impelindo-a a chupa-los. Chapou a palma da mão contra a púbis, remexendo o emaranhado de pêlos não muito fartos e alcançou-lhe os lábios molhados do sexo. Ela agitou-se arrastando um gemido. Fedia a bacalhau. Aquele que na panela fervilhava. Aquele que o homem comeria à mesa, onde o Quim, o homem que o marido enviara com o propósito de arranjar a máquina, naquele momento sacudia as crinas do cabelo forte e escuro, e fechava os olhos ao mesmo tempo que sentia o malho a adensar-se, e penetrava as pregas do soalho pélvico da sua mulher e os dedos encharcados pela sua vagina, na boca, fazendo-a provar-se.
Ao perto, os sinos de S. Francisco badalavam o meio-dia enquanto ela lhe cravava as unhas como uma cadela que esgaravata a terra depois de urinar, e de olhos esbugalhados no tecto, sentia as primeiras contracções lentas, e ainda que efémeras, lhe esboçavam nos lábios um sorriso eucarístico de satisfação pelo orgasmo. Bem próximo, numa expressão pesada e de pálpebras cerradas, ele, que sentira a seda contráctil da sua vagina, seguia o compasso e na abóbada do seu corpo, semeava, a cada estocada, a substância ácida do pénis, rugindo, e no seu peito desfalecendo até recuperar o fôlego.
Vestindo-se sem demora, ordenou que levasse então a máquina. Para hoje não me faz falta, disse ela, arranjando o cabelo, ai a porra do bacalhau que já deve estar desfeito, carai! E foi até ao fogão, desligando-o. Também, tanto faz, diz sempre que está uma merda, merda por merda, come o que lhe ponho na mesa. Vá lá, despache-se e saia daqui que ele deve estar a chegar. Amanhã, pela manhã, uma hora mais cedo, venha. Pode ser?, questionou sorrindo com olhos de rogo e ardência no corpo. Pode, Dona. A Dona só manda. Amanhã cá estarei, uma hora mais cedo, informou com um ar maroto, enquanto afagava o mangalho. Vá, vá!, empurrava-o ela, pela porta fora. Ele parou de frente dela e num olhar sério e ansioso, disse: Espero que a tenha agradado, Dona. Bem sei que se tivesse a figura do cônsul do prédio da frente, teria outro encanto... o gabinete, o tampo da secretária, a fatiota... mas garanto-lhe que não perdeu o dia, Dona. Piscou o olho e saiu, para seguir caminho.